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Marco António Costa

Sketchbook Therapy

Não raras as vezes, fala-se do caderno como coisa humilde, modesta, frágil, privada, sem destaque. Nos discursos que empregam estes termos, sente-se que são utilizados num contexto positivo, de modo a valorizar a sobriedade, a discrição e até mesmo a simplicidade, de modo que o caderno seja sentido como um instrumento, um meio, uma coisa ao serviço de algo.

Anunciar o caderno como um meio para um fim, tem sido uma forma de justificar outra coisa qualquer para além do caderno em si. São problemas exteriores ao caderno aquilo que vai alimentando algum pensamento sobre o mesmo. Por vezes são as viagens, o conhecimento etnográfico e antropológico, outras vezes é a memória, a pedagogia e os recursos de aprendizagem, outras ainda, são questões estéticas e/ou comunicativas.

Diversas áreas puxam para si, ou atribuem, funções várias ao caderno que se tornam vantajosas e desejáveis, mas apenas para benefício dessas mesmas áreas. Neste caso, o caderno é uma espécie de Santa Teresa d´Ávila, por onde diversas fações reclamam para si um pedaço desse corpo para louvar e dar um sentido existencial (e talvez mesmo místico) à sua relação com o caderno.

No entanto, não raras as vezes, alguém fala da inutilidade do caderno. Diz-se que esta inutilidade se baseia na forma como os conteúdos parecem ser destinados ao seu autor, sem qualquer intenção de responder a necessidades de outrem. Quer dizer que o caderno, afinal, não é um meio para fins práticos, úteis e necessários. Esta ideia de inutilidade pode ser uma confirmação de como não faz sentido associar os desenhos num caderno à noção de registo, já que a inutilidade contraria a necessidade e, portanto, afasta a ideia de que se desenha para outros fins exteriores a si.

A existência do caderno como possibilidade permite que esta subjetividade se manifeste sem prejuízo de se apresentar como um paradoxo, um erro, uma indecisão, um esboço, uma coisa a prazo e não acabada que se proporciona a acrescentos e a rasuras, adicionando outros tempos ao mesmo espaço. Um caderno fecha-se e abre-se tornando-se privado e público sem que o seu conteúdo se modifique, centrando em si o acesso a múltiplas camadas de expressão em possibilidades infinitas de leitura pela imaginação.

O caderno permite ao sujeito identificar o conteúdo não como um facto passado, uma espécie de “isto foi” ou, como um facto presente, como um, “isto é”, mas antes, como uma projeção futura, “isto pode ser”.

Marco António Pereira da Costa

Nasceu em Vila Nova de Gaia em 1978. 

Licenciado em Design de Comunicação pela Faculdade de Belas-Artes da Universidade do Porto (FBAUP); Mestre em Arte Multimédia pela FBAUP; Doutor em Artes Plásticas pela FBAUP. 

Reconhecimento do currículo profissional especialmente adequado em Arte e Design pelo Conselho Técnico-Científico da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Bragança (ESE-IPB). Membro do Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade (I2ADS); Docente do Departamento de Artes da ESE-IPB.

Desenvolve o seu trabalho no campo das artes visuais entre a docência, investigação, produção, curadoria e crítica.

Expôs em mais de 120 eventos coletivos ligados às artes plásticas, ao design e ao multimédia desde 2000, entre os quais, 3 exposições individuais de pintura e desenho.

Mantêm desde 2009, o projeto online Sketchbook Therapy dedicado aos seus diários gráficos.

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